Para especialista, transferência de revólveres poderia aumentar onda de violência
Epitácio Pessoa/03.08.1999/AE
Policial de São Paulo recebe treinamento com revólver calibre 38 em 1999
Os motivos para a recusa dos "três oitão" também são os mesmos que fizeram a polícia de São Paulo se mover no sentido da substituí-los: esse tipo de arma tem menor capacidade de tiros, é pouco veloz e não tem a precisão de uma pistola .40, atualmente utilizada pela PM paulista. Um disparo de revólver calibre 38, segundo especialistas, tem também muito mais chances de perfurar o alvo e ainda atingir inocentes ao redor.
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A Polícia Militar de São Paulo estimava, inicialmente, que 37.000 armas seriam doadas, entre pistolas e revólveres. O número realmente doado, que “não pode ser divulgado por questões estratégicas”, é inferior porque os Estados acabaram demonstrando interesse em adquirir apenas pistolas.
Por exigências do Exército Brasileiro, que realiza o controle do armamento e munição no País, é necessário gastar dinheiro para a doação de cada arma. Além de arcar com os custo do transporte dela, o Estado que recebe o armamento precisa apagar o brasão de identificação da PM paulista e imprimir o brasão da Polícia Militar local.
— Por essa razão, alguns Estados acabaram não tendo interesse no recebimento dos revólveres, que possuem uma capacidade de tiros inferior à de uma pistola, um valor de mercado inferior e um custos de transferência.
"Presente de grego" A transferência anunciada pelo governador Geraldo Alckmin dos "três oitões" para Estados do Norte e Nordeste com alguns dos maiores índices de violência do País poderia causar um efeito contrário do esperado, na avaliação do presidente do Viva Rio, Flávio Rangel. A oferta de equipar as polícias do Nordeste e Norte é “presente de grego”, e poderia “aumentar ainda mais os índices de criminalidade”.
— Estão oferecendo um presente de grego, porque a impressão é de que vai aumentar a segurança, mas tenho certeza de que vai aumentar ainda mais o número de homicídios de inocentes. Segundo as últimas estatísticas [baseadas em dados do SUS], é no Norte e no Nordeste onde os homicídios por armas de fogo mais tem aumentado, uma média de 40%. O contexto de truculência na abordagem e no despreparo dos soldados, tão comum nessas regiões, pode fazer com que a utilização do revólver 38 cause ainda mais mortes.
Já na avaliação do professor da UERJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Ignácio Cano, aceitar a doação dos "três oitão" provocaria como efeito colateral um custo político. Isso porque, segundo ele, poderia gerar forte revolta dos policiais, que ficariam contrariados em utilizar um armamento ultrapassado.
— Ninguém vai ser obrigado a aceitar. Mas pode soar arrogante o Estado de São Paulo oferecer armas obsoletas sem ter feito uma sondagem de interesse de outros Estados. [...] Politicamente, acho que pode ser complicado, mas só cada um dos Estados pode decidir se aceita ou não.
A reportagem do R7 entrou em contato com as secretarias da Segurança Pública do Maranhão, Paraíba, Rio Grande do Norte, Acre, Tocantins, Rondônia e Piauí. Os órgãos estaduais disseram que já firmaram acordo com o governo paulista para receber pistolas em vez de revólveres calibre 38. O Rio Grande do Norte afirmou que irá ganhar 5.000 armas modelo PT 100. Já o comandante da Polícia Militar de Alagoas, Luciano Antônio da Silva, disse que a corporação ganhará de São Paulo 2.000 pistolas modelo PT 24/7, o mesmo utilizada pela PM paulista (veja o infográfico abaixo).
Policiais dividem armas
O armamento das forças de segurança do País é ainda bastante desigual e uma doação poderia ser uma medida paliativa enquanto recursos estaduais e federais não são viabilizados, na opinião da presidente do Instituto Sou da Paz, Melina Risso.
Para ela, a transferência pode ser benéfica para regiões onde policiais militares são obrigados a dividir uma mesma arma com vários colegas, “uma realidade ainda bastante evidente”. Um revólver ou uma pistola para cada um poderia, inclusive, auxiliar na identificação da autoria dos disparos.
— Muitas vezes, você pode ajudar a equipar e trazer às polícias [do Norte e Nordeste] um mínimo de patamar de trabalho. Não colocaria, a princípio, que essa ação [de transferência de armas] é inadequada e que não deveria acontecer. Às vezes, a realidade se impõe muito mais do que um processo ideal. Não dá para dizer o que seria indicado, se ainda não se conseguiu nem a universalização dos equipamentos.
Rangel, porém, rebate, e diz que "fiscalização não existe no Norte e no Nordeste” e o uso das pistolas por policiais despreparados pode aumentar os crimes cometidos por armas de fogo.
— O revólver exige bastante treinamento, não é a mesma coisa que usar uma pistola. Como oferecer armas desse modelo a uma polícia que não garante a capacitação dos seus profissionais? Seja pistolas ou revólveres, são armamentos letais, inseridos em uma cultura de truculência e sem o preparo para utilizá-las.
O diretor da ONG Viva Rio ainda alerta para a possibilidade de, com a transferência, armamentos irem parar nas mãos de criminosos.
— Geralmente, elas são exportadas mal e parcamente e a própria polícia começa a vender armamento. O banditismo vai ficar feliz em comprar essas armas de policiais corruptos. No fundo, a transferência de armas é uma medida que só seria benéfica se fosse acompanhada por outro conjunto de medidas, como treinamento especial e fiscalização efetiva.
Doação O Estado de São Paulo não arcará com nenhum custo de transferência, informou a assessoria de imprensa da PM. A doação já foi autorizada pelo Exército Brasileiro e será formalizada por meio de decreto estadual, ainda não publicado. Ainda de acordo com a Polícia Militar paulista, os revólveres recusados pelos governos do Norte e Nordeste não serão destruídos por ainda funcionarem bem e podem ter utilizado em atividades secundárias da corporação.
Fonte: http://noticias.r7.com/
Republicado por : RONDA MGR
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